Em seis meses desde a assinatura do acordo de cooperação técnica entre o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Advocacia-Geral da União (AGU), o órgão de representação jurídica da administração pública deixou de enviar mais de 170 mil recursos ao tribunal e desistiu de 630 processos que já tramitavam na instância especial. Neste dia 24 de dezembro, sob a gestão do ministro Humberto Martins, presidente do STJ, e do advogado-geral da União, José Levi Mello Júnior, o acordo foi prorrogado por mais seis meses.
A parceria, feita em junho, surgiu com o objetivo de racionalizar a tramitação de processos, além de prevenir litígios, por meio do intercâmbio de dados, documentos e informações de interesse recíproco. Por representar judicialmente a União e diferentes órgãos e entidades federais perante o STJ, a AGU é um dos maiores demandantes do tribunal.
Para o ministro Humberto Martins, os números revelam o benefício mútuo alcançado pelo acordo, que reduziu especialmente a interposição de recursos contrários à jurisprudência da corte. “A iniciativa do STJ demonstra o uso da inteligência gerada pelo tribunal a serviço da eficiência da Justiça”, afirmou.
Desjudicialização
Durante a execução do acordo, foi disponibilizado à AGU um estudo técnico dos processos em que os órgãos e as entidades representados por ela figuravam como parte, para auxiliá-la no alcance dos objetivos propostos – como a prevenção de litígios, o gerenciamento de precedentes qualificados e o fomento à resolução consensual das controvérsias.
Essa iniciativa permitiu a aplicação de mecanismos de desjudicialização, a partir da identificação das hipóteses em que a pretensão do ente público era contrária aos precedentes do tribunal, o que daria ensejo a sucessivas situações de não conhecimento ou desprovimento dos recursos.
Dessa forma, foram estabelecidas estratégias, como a identificação, ainda nas instâncias de origem, das controvérsias que contavam com precedentes do STJ e o estabelecimento de regras de controle interno da AGU para que, nessas hipóteses, o procurador estivesse autorizado a não recorrer à instância especial ou mesmo desistir do recurso apresentado, de modo a evitar que o recurso fosse encaminhado ao STJ.
Objetivo estratégico
Segundo o titular da Secretaria Judiciária do tribunal, Antonio Augusto Gentil, os benefícios do acordo serão mais bem sentidos a médio prazo. Para ele, os números já alcançados trazem a perspectiva de que, no próximo ano, haja um expressivo corte na quantidade de processos encaminhados pela AGU, o que concorrerá para a redução da demanda processual do STJ – um dos principais objetivos estratégicos do tribunal.
Uma das medidas implementadas no acordo foi a identificação, antes da etapa de distribuição aos ministros do STJ, dos processos com temas federais afetados pela sistemática dos recursos repetitivos, os quais passaram a ser devolvidos à origem.
Ao longo desse período, os três braços da AGU (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Procuradoria-Geral Federal e Procuradoria-Geral da União) também fizeram indicações ao Núcleo de Gerenciamento de Precedentes do STJ (Nugep) a respeito de temas com possível multiplicidade, para que os recursos fossem avaliados e selecionados para distribuição como representativos de controvérsias.
Trabalho conjunto
De acordo com a titular do Nugep, Maria Lúcia Paternostro, a partir das sugestões recebidas, foram indicadas três propostas de controvérsias, sendo que uma já foi afetada ao rito dos recursos repetitivos. Para ela, o acordo é de grande valia para o trabalho realizado pelo núcleo, uma vez que os procuradores litigam desde a primeira instância e já conseguem identificar os temas de grande vulto antes mesmo de os recursos chegarem ao STJ.
“Isso é fundamental para o nosso trabalho, pois, antes da distribuição dos processos aos ministros, nós já conseguimos analisá-los para propor a afetação”, ressaltou. Em sua avaliação, o acordo agrega ao trabalho de inteligência e monitoramento de temas realizado pelo tribunal.
Péricles Sousa, procurador da Fazenda Nacional, afirmou que essa parceria “acelera uma série de políticas internas no âmbito das carreiras da AGU, para que, a cada ano, o tribunal possa receber apenas o que for mais estratégico e de impacto sistêmico”.