A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou, nesta segunda-feira (3), o ex-presidente do Tribunal de Contas do Amapá (TCE-AP) Júlio Miranda, a 14 anos, 9 meses e 23 dias de reclusão, em regime inicial fechado, por peculato-desvio. O colegiado decretou a perda do cargo público de conselheiro do TCE-AP.
No mesmo julgamento, a Corte Especial condenou o conselheiro Amiraldo da Silva Favacho a 6 anos, 11 meses e 10 dias de reclusão, também em regime inicial fechado, pelo crime de peculato-desvio, bem como à perda do cargo no TCE-AP.
Na ação, originada da Operação Mãos Limpas, Júlio Miranda foi acusado dos crimes de peculato, de forma continuada; ordenação de despesas não autorizadas e quadrilha, relacionados ao desvio de mais de R$ 100 milhões de verbas do tribunal.
De acordo com o Ministério Público, os desvios eram feitos por meio de saques de cheques na boca do caixa, de forma sistemática, da conta-corrente do TCE-AP e também por reembolsos indevidos de despesas hospitalares e médicas, pagamento de salários e passagens aéreas a pessoas estranhas ao quadro de pessoal do Tribunal de Contas, além do recebimento de verbas remuneratórias sem respaldo legal.
Amiraldo da Silva teria sido responsável pela assinatura de cheques no valor de R$ 1,3 milhão no período em que exerceu a presidência interina do TCE-AP, substituindo Júlio Miranda.
Investigação legítima
Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora da ação penal, ao contrário do que sustentou a defesa, as investigações não foram deflagradas exclusivamente após denúncia anônima, razão pela qual não há nulidade a ser reconhecida.
“Não há nulidade a ser declarada se a narrativa de delatio criminis anônima for corroborada por elementos informativos complementares obtidos pelas autoridades competentes que denotem a verossimilhança da comunicação, pois o que se veda é que a investigação seja lastreada única e exclusivamente nos fatos narrados de forma apócrifa”, afirmou a relatora.
A ministra explicou que as investigações com foco no TCE-AP, bem como as medidas de busca e apreensão e de quebra de sigilo, foram fundadas em diversos e entrelaçados fatos já em investigação, cujas informações foram complementadas por diligências adicionais.
O colegiado reconheceu a prescrição da pretensão punitiva em abstrato de fatos imputados a Júlio Miranda em relação às acusações de ordenação de despesas sem autorização legal, quadrilha, peculato pelo pagamento indevido de servidores sem vínculo com o TCE-AP e recebimento indevido de ajuda de custo.
Dinheiro em espécie
Nancy Andrighi afirmou que as assinaturas de Júlio Miranda e de Amiraldo da Silva, em cheques que tinham como emitente e beneficiário o próprio Tribunal de Contas, destinados, pois, exclusivamente à obtenção de dinheiro em espécie mantidos na conta-corrente do órgão púiblico e contabilizados na rubrica genérica “outras despesas variáveis”, configura o crime de peculato-desvio, por ser ato de execução do desvio de recursos públicos de sua finalidade pública própria.
No exercício da função pública, “o réu assinou, como representante do TCE-AP, o anverso dos cheques emitidos em favor do próprio sacador, o TCE-AP, de forma a ser evidente o propósito de obtenção de numerário em espécie”, comentou a relatora.
No caso do conselheiro Amiraldo da Silva, a ministra afirmou que há prova de materialidade da conduta, e que ele mesmo admitiu que assinou cheques que foram sacados tendo como beneficiário o próprio TCE-AP.