Por não verificar resistência do réu em cumprir decisão liminar, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu recurso de um posto de gasolina localizado em Sorocaba (SP) e afastou a multa diária (astreintes) imposta com o fim de compeli-lo a remover um contêiner que obstruía a passagem e o arejamento do imóvel comercial vizinho.
Para o colegiado, o cumprimento da determinação judicial não contou com resistência do recorrente e solucionou os principais problemas apontados pelos vizinhos – como segurança, passagem e ventilação –, não havendo motivo para a exigência de astreintes nos autos.
O recurso se originou de pedido de tutela provisória antecedente a ação de obrigação de fazer, por meio do qual os proprietários do comércio vizinho requereram a retirada do contêiner que impedia a abertura de uma porta e das janelas do imóvel.
O juiz concedeu a tutela de urgência para determinar a retirada do contêiner, sob pena de multa diária de R$ 1 mil, ao fundamento de que foi demonstrada a nocividade de sua colocação no local, especialmente diante da existência de substância inflamável no imóvel vizinho.
Ao fiscalizar o cumprimento da ordem, o oficial de Justiça atestou que o contêiner havia sido mudado de lugar para desobstruir a propriedade vizinha.
Na sentença, o magistrado confirmou a tutela provisória e condenou o réu, por ofensa ao direito de vizinhança, a retirar o contêiner do local, aplicando a multa por descumprimento da determinação. A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
Medida acessória
No recurso especial, o posto de gasolina defendeu a revisão das astreintes, pois a mudança do local do contêiner após o deferimento da antecipação de tutela teria sido suficiente para cessar qualquer prejuízo aos vizinhos. O posto também afirmou que a estrutura foi definitivamente retirada do local meses antes da sentença.
A ministra Nancy Andrighi, relatora, afirmou que a multa cominatória nas ações de obrigação de fazer ou de não fazer constitui medida de apoio que busca compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação, mas que, conforme precedente da Segunda Seção, pode ser revista a qualquer tempo, tendo em vista que ela não se submete à preclusão ou aos efeitos da coisa julgada.
A relatora ressaltou que a resistência do devedor é elemento central para a modificação do valor ou da periodicidade, ou mesmo para a exclusão da multa cominatória, nos termos do parágrafo 1º do artigo 537 do Código de Processo Civil.
No caso dos autos, Nancy Andrighi observou que o posto de gasolina demonstrou, desde o início da ação, não ter imposto qualquer resistência à satisfação da obrigação de fazer requerida na tutela provisória de urgência, pois, antes mesmo de ser citado, já havia removido a estrutura da proximidade das portas e das janelas do comércio vizinho.
Dubiedade
Além disso, a relatora destacou que a decisão que deferiu a tutela de urgência era dúbia, e não foi ratificada pelo juiz de primeiro grau, mesmo após a declaração do oficial de Justiça e a apresentação da contestação. Assim, segundo a ministra, não houve confirmação da liminar ou manifestação do magistrado sobre eventual descumprimento da tutela provisória até o momento em que foi proferida a sentença.
Ela concluiu que “o bem jurídico protegido pela pretensão dos recorridos – segurança, iluminação, arejamento do imóvel e locomoção de seus clientes, em caso de incêndio – estava eficazmente protegido com o cumprimento, mesmo que parcial, da obrigação de movimentação do contêiner” e que “havia justa causa para o cumprimento parcial, decorrente da atuação dúbia do juízo do primeiro grau de jurisdição”.
Nessas circunstâncias, ressaltou que “é imperiosa a revisão das astreintes, eis que, na situação específica dos autos, não atuaram como meio de coerção indireta ao cumprimento da obrigação de fazer requerida na inicial”.
Leia o acórdão.