O Plenário do Supremo Tribunal Federal prestou, nesta quarta-feira (7), homenagem ao ministro Celso de Mello, decano da Corte, que se aposenta na próxima terça-feira (13). Durante a sessão ordinária, ministros e autoridades de órgãos de representação judicial exaltaram o legado que Celso de Mello deixa para o STF e para sociedade brasileira.
Farol do Supremo
O presidente do STF, ministro Luiz Fux, classificou o homenageado como um juiz visionário, republicano e progressista, “um homem à frente de seu tempo”, e por outro lado, destacou sua postura serena e o seu perfil conciliador, que o transformaram em um “decano singular desta Corte: ponto de equilíbrio nos momentos de instabilidade e farol nas situações de escuridão”. Fux lembrou que, ao longo desses 31 anos no Supremo, o decano se comprometeu com a busca da justiça, sobretudo para os grupos menos afortunados e historicamente marginalizados.
Para o presidente, o ministro Celso de Mello é inspiração pessoal e referência profissional para todos os que ocupam uma cadeira no STF, em razão de sua altivez e sua cordialidade, que o tornaram uma inegável referência interna e uma liderança natural. “É ele quem nos socorre nas questões sensíveis, com lições sábias e conselhos acolhedores. É ele quem toma a frente para preservar e defender o tribunal nos momentos delicados, com discrição e autocontenção, mas coragem heroica”, afirmou. Sua mensagem de liderança se encontra fixada nas paredes do STF, na placa em que define “a missão institucional deste Tribunal para quem nele adentra”.
Trajetória modelar
No discurso em que falou em nome da Corte, a ministra Cármen Lúcia destacou que o Plenário do Supremo terá, para sempre, a força da presença moral e intelectual do ministro Celso de Mello, “seu exemplo vital, sua ética pessoal e profissional a nos conduzir e a nos comprometer com tudo quanto por ele feito em sua trajetória modelar de ser humano, de cidadão e de juiz”. Segundo a ministra, Celso de Mello alia “a firmeza de decisões com a lhaneza de trato, a seriedade da conduta com leveza do convívio, a profundidade do saber com a diversidade dos saberes”.
A diversidade dos saberes foi exemplificada com a música e as artes. A ministra lembrou que o decano conhece compositores dos clássicos aos sertanejos, de óperas à música popular brasileira, discute datas e tendências musicais, “em aprimorado conhecimento de pouca suspeita pelos que apenas entreveem sua permanente entrega ao Direito”. “De repente, ensina matéria que não é de Direito. É muito para lá do Direito, proseia sobre a vida”, disse. “Também conta fatos e atos da história do Brasil e do mundo, detalha datas e personagens, ri de passagens hilárias e choca-se com degradações desumanas. É um sábio”.
Para a ministra, Celso de Mello, “homem bom e de bem”, é essencial ao Brasil, “onde a maldade tantas vezes tem tido assento privilegiado em detrimento do cidadão e da República”. Ela destacou sua intransigência com a desonestidade, a corrupção, a promiscuidade e as práticas antirrepublicanas e antidemocráticas. “É um brasileiro empenhado em um viver republicano, crente em que é esta a forma de governo legítima em prestígio à igualdade cívica, à liberdade igual a todos assegurada e à responsabilidade por todos a ser assumida na experiência do viver em comum”, ressaltou.
Ao lembrar as manifestações históricas do decano em julgamentos e decisões, a ministra Cármen destacou que seus votos são fontes permanentes de pesquisa, de orientação e, principalmente, de chamamento à responsabilidade de todos para com o regime democrático, com as liberdades públicas e com os direitos fundamentais. “Seus votos invocam a República, seus gestos reverenciam a República, seus atos acatam a República”, ressaltou.
Manifestações dos pares
Mesmo representados pela ministra Cármen Lúcia, diversos integrantes do Tribunal pediram a palavra para demonstrar sua admiração ao decano e lamentar a regra que impõe seu afastamento compulsório.
O ministro Alexandre de Moraes destacou o papel de Celso de Mello como “um dos maiores artífices do texto constitucional e da construção da democracia brasileira pós-Constituição de 1988”. Segundo ele, sua obra é imprescindível aos intérpretes do texto constitucional e obrigatória aos agentes públicos que pretendem o fortalecimento da democracia, do estado democrático de direito, dos mecanismos de controles institucionais e do combate à corrupção e a defesa da honestidade, da moralidade e da probidade administrativa.
Para o ministro Edson Fachin, Celso de Mello poderá ser sucedido no Tribunal, “mas nunca substituído”. Fachin apontou a sensibilidade e a inteligência do colega e afirmou que bem agem os que seguem o seu exemplo, “não apenas em palavras, mas também em gestos e comportamentos, na discrição, na serenidade firme e na defesa da legalidade constitucional.
O ministro Luís Roberto Barroso destacou a personalidade de extrema fidalguia e generosidade do homenageado, em especial com os ministros recém-chegados ao Tribunal. Ao relembrar votos marcantes, Barroso afirmou que, em sua atuação como juiz, aberto para o novo, “Mello foi capaz de preservar as tradições e estar sintonizado com o espírito do tempo”.
De acordo com a ministra Rosa Weber, o decano representa um paradigma no exercício da jurisdição constitucional e na afirmação das liberdades dos direitos fundamentais e dos grupos minoritários, mas, sobretudo, na “incansável e intransigente” defesa institucional do STF e do Poder Judiciário contra atos, condutas e movimentos reveladores de arbítrio, autoritarismo, intolerância e incompreensão sobre o papel de uma Corte constitucional em um Estado Democrático de Direito.
Ao homenagear o decano, o ministro Ricardo Lewandowski relembrou a última sessão da Segunda Turma com a participação de Celso de Mello, ontem (6). Segundo ele, o ministro deixou mais uma de suas “pérolas de sabedoria jurídica”, ao afirmar, no julgamento de um habeas corpus, que o processo penal e os tribunais são, por excelência, espaços institucionalizados de defesa e proteção dos réus contra possíveis excessos e arbítrio do poder, especialmente em face de abusos perpetrados por agentes estatais no curso da persecução penal.
O ministro Dias Toffoli lembrou de aspectos do convívio diário com o colega que se aposenta. “Faz parte do meu destino. Conviver com ele é saborear cultura, respeito e amizade”, afirmou. Segundo Toffoli, os ministros puderam aprender com Celso de Mello que cordialidade, simplicidade e conciliação são características que enobrecem ainda mais o ofício da jurisdição constitucional, por viabilizar o diálogo, essencial em uma democracia. “Celso de Mello sempre se mostrou um juiz desassombrado e intransigente na defesa da dignidade da pessoa humana, dos direitos e das liberdades fundamentais”, assinalou.
Leia a íntegra do discurso do ministro Luiz Fux.
Leia a íntegra do discurso da ministra Cármen Lúcia.
EC, SP//CF